O cego de nascença



“1 E passando Jesus, viu um homem cego de nascença. 2 Perguntaram-lhe os seus discípulos: Rabi, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego? 3 Respondeu Jesus: Nem ele pecou nem seus pais; mas foi para que nele se manifestem as obras de Deus.” (João 9,1-3).

Na passagem bíblica do “Cego de nascença” (João 9,1-3), o que mais nos interessa não é a resposta de Jesus, mas sim, a pergunta que os discípulos fazem ao Divino Mestre no 2º versículo. Ora, se os apóstolos de Jesus consideram a hipótese de que o referido deficiente visual teria pecado, isso somente pode ter sido em uma vida passada. Desta forma, é lógico concluir que o povo daquela época acreditava, sim, na existência das vidas múltiplas, em outros termos, na reencarnação. Mas, voltando ao “cego de nascença”, observemos os dizeres do pesquisador Paulo da Silva Neto Sobrinho:

Como um cego de nascença poderia ter pecado? Se a cegueira fosse “castigo de Deus” pelos pecados daquele homem, onde estaria seu pecado, se nascera cego? Neste caso, o seu pecado, para ser lógico, só poderia ter sido cometido antes dele nascer, ou seja, em uma de suas existências anteriores. Fato em que os discípulos acreditavam, pois só assim justificaria a pergunta deles a Jesus: “Quem pecou, para este homem ter nascido cego, foi ele ou seus pais? Diante do princípio “a cada um segundo suas obras” (Mt 16,27), no dizer do Mestre, ninguém paga pelo erro do outro, ficando a responsabilidade dos atos atribuído às próprias pessoas que os praticam. A resposta de Jesus “Nem ele nem seus pais, mas isso aconteceu, para que as obras de Deus se manifestem nele”, poderá ser explicada da seguinte forma: diante de tanta ignorância e atraso espiritual daquele povo havia a necessidade de Jesus fazer alguns “milagres”, como os fez, no sentido de despertar as criaturas para as verdades do Pai. Assim, com Jesus encarnaram vários espíritos que vieram com a tarefa de auxiliá-lo em sua missão, e este homem cego era um deles. Aqueles que escolheu como apóstolos largaram tudo para segui-lo, atendendo o seu chamado, que funcionou como lembrete do compromisso que assumiram, quando estavam no plano espiritual. (NETO SOBRINHO, 2006, pp. 237-238).

Vejamos sobre esse tema a opinião do professor José Reis Chaves:

Vamos ver agora um outro episódio do Evangelho de Jesus, em que nos deparamos com mais uma sugestiva ideia da reencarnação, na qual os próprios discípulos do Mestre demonstraram acreditar. Eis o que nos diz o texto bíblico: “Caminhando, Jesus viu um homem cego de nascença. E os seus discípulos perguntaram: Mestre, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?” (João 9,2). Temos de atentar para o fato de que era normalmente aceito por todas as pessoas do Oriente Médio daquela época que, se uma pessoa nascesse com qualquer deficiência física ou mental, era por um pecado dela cometido em uma vida anterior, ou por pecado cometido por seus pais. Esqueçamo-nos, por enquanto, da resposta de Jesus, e concentremo-nos somente na pergunta dos discípulos. Nela está implícita, com muita clareza, que os discípulos que fizeram a pergunta a Jesus aceitavam a reencarnação. Não podemos negar esse fato, que era também do inteiro conhecimento de Jesus, mesmo porque Ele conhecia até o pensamento das pessoas. (CHAVES, 2012, p. 101).

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E sobre o episódio evangélico da cura do cego de nascença, fazemos as seguintes perguntas: Se a crença na reencarnação fosse um erro, se Jesus sabia que seus discípulos acreditavam nela, e se Ele teve oportunidade de condená-la e de repreender os seus discípulos por estarem em erro, por que Ele não o fez? Desse silêncio de Jesus, só podemos concluir que Ele não considerava a reencarnação como sendo um erro, pois, como diz o ditado popular, quem cala, consente. E essa conclusão torna-se uma verdade inconteste, quando sabemos que a omissão é também um pecado, e pecado é uma falta que não podemos atribuir a Jesus. (CHAVES, 2012, p. 102-103).